domingo, 3 de abril de 2011

A BODEGA DE MANÉ VIRGULINO


A BODEGA DE MANOEL VIRGULINO

Sal grosso, açúcar e rapadura,

Querosene, biscoito e sianinha,

Feijão, arroz e também farinha,

Óleo de Peroba e até gordura,

Agulha, dedal e carretel de linha,

Isso nas prateleiras e no balcão,

Sem contar com bolacha e sabão,

Misturados naquele estripuliço,

Um anzol, uma vara e um caniço,

Prá aumentar mais ainda a confusão.


Um caixão de madeira bem no canto,

Onde o açúcar Seu Mané armazenava,

Era ali que a garotada brincava,

E esse fato causava muito espanto,

E quando Mané Virgulino cochilava,

A menineira no caixão caia,

Comia açúcar e o bolso enchia,

O barulho acordava o Virgulino,

Que gritava: sai daí menino...!

Infância boa e cheia de alegria.


Cocada misturada com corda de fumo,

Pão doce no depósito de anelina,

Corda de agave e agulha fina,

A bodega vendia até estrumo,

Comprimido, só tinha penicilina,

Seu Mané não era bem humorado,

Pegava ar e era malcriado,

Não gostava de pergunta idiota,

Pra elas sempre tinha resposta,

E nunca na vida ficava calado.


Evandro, um menino bem traquino,

Descobriu de Mané um fato raro,

Achou o fósforo um produto caro,

Seu Mané pegou ar com o menino,

Falou num tom franco e claro:

Seu dinheiro pra mim falta não faz,

Sua presença incomoda muito mais,

Mas lhe dou o estoque da farinha,

Se você fizer uma cabecinha,

De um desses palito. É Capaz?


Este fato pela rua se espalhou,

Todo mundo procurava o endereço,

Apenas para saber o preço,

Da caixa de fósforos, o valor.

Seu Mané que rezava muito o terço,

Começou pelo o cão a esbravejar,

Com a mãe de Evandro foi falar,

Pois todos da cidade perguntavam,

Quarenta palitos quanto custavam,

Isso fazia seu Mané no cão virar.


Tapioca com manteiga e côco,

Bolacha soda vendia muito bem,

Não precisava gritar aqui tem,

Porque Dona Regina fazia pouco,

O moleque de açúcar também,

Era outro produto ali vendido,

Mas eu tava ficando esquecido,

Que o fósforo ele deixou de vender,

Tentando fazer o povo esquecer,

De Evandro que o tinha ofendido.


Perguntar num faz mal e eu pergunto,

Seu Mané tem pão crioulo ou carteira?

Se tiver o senhor bota dois na feira,

E quero mudar logo de assunto,

Falando sério e sem brincadeira,

Uma caixa de fósforo quanto é?

Respondia com raiva batendo o pé,

Eu deixei de vender fósforo aqui,

Por conta do moleque de Aní,

Nunca mais vendo, em Deus tenho fé.


Tinta ocre, xadrez e muito cal,

Cimento misturado com feijão,

Do lado de fora olhando pro chão,

Dava prá ver todo aquele escambal,

Balança e pesos em cima do balcão,

Para pesar carvão e também fubá,

Nesse instante num quero nem pensar,

Na carne de charque que era magra e fina,

E bem do lado uma lata de creolina,

Que fazia a confusão aumentar.


Tudo você podia na bodega comprar,

Só fósforo ali não vendia,

Mas Nonato Biuta tinha mania,

De tirar dúvida e ali foi testar,

Esboçando certa simpatia,

Perguntou a Mané Virgolino,

Com educação e trato fino,

Aqui tem fósforo prá vender?

Vá embora! pra sua mãe eu não ofender,

Vá chatear seu pai, menino!


Foice, martelo, pua e roçadeira,

Inseticida e veneno de formiga,

Mato verde para acabar intriga,

Espoleta e também peixeira,

Erva doce para dor de barriga,

Fósforo não tinha nem de brinquedo,

Esse item ali causava medo,

Era fácil encontrar até batina,

A glostora era a melhor brilhantina,

Mas Fósforo! Esse não dava enredo.


Agostinho que era meu melhor amigo,

Que na música era ás em cavaquinho,

E não era um menino dos bonzinho,

Com um jeito que eu jamais consigo,

Foi até a bodega e com o seu jeitinho:

Se tiver fósforo eu quero uma caixa,

Mas logo ele leu uma faixa,

Onde estava escrito bem assim:

“Não vendo fósforo nem pra mim,

Quanto mais pr’essa gente baixa.”


Fazendo que nada tinha lido,

Agostinho insistiu tem ou não tem,

Seu Mané ficou num louco vai-vem,

E gritou: vá embora seu fudido,

Vou falar com seu pai também,

Não tenho fósforo nessa porra,

Seu filho de uma cachorra,

Ou acabam com essa brincadeira,

Ou termino fazendo uma besteira,

Fechando em Itaporanga essa zorra.


Barbante, escova e palito de dente,

Óleo de rícino e óleo de linhaça,

Cangalha prá jegue e até cabaça,

Contra o piolho tinha pó e pente,

Na esquina do balcão, servia cachaça,

Era uma miscelânea na mercearia,

Olhando de frente era uma agonia,

Não vendia a quem tivesse de pileque,

Mas para agente que era moleque,

Tudo aquilo era uma grande alegria.


Mas o tempo rápido passou,

Hoje estamos todos adultos,

Uns bem de vida outros cultos,

Da infância só a marca ficou,

Seu Mané foi um dos vultos,

Que fizeram a nossa cidade,

Hoje com muita tranqüilidade,

Brinco em versos com sua zanga,

Parte da historia de Itaporanga,

História feita com felicidade.


Seu Manoel era um homem honrado,

Itaporanga toda lhe queria bem,

Sensato, cristão como ninguém,

Era enfim um homem respeitado,

Era bom pai de família também.

Criou seus filhos com educação,

José Virgulino era um bonachão,

Tinha uma que foi ser religiosa,

Valdemar era dado a uma prosa,

Darcí, figura de bom coração.


Ainda tinha Bia e Antenor,

Mané Virgulino casou com Regina,

Que manteve na casa a disciplina,

Um casamento que cultuava o amor,

Nascer um para o outro é sina,

Coisa que hoje ninguém mais ver,

O casamento assim era fácil de manter,

A união durava a vida inteira,

A família era a base, era a esteira,

União assim, hoje é difícil ter.


Para terminar essa história,

Que aumentei, mas não inventei,

É cultura nossa e eu me esforcei,

Para o personagem ficar na memória,

Busquei a infância e até rimei,

Com pessoas que na mente eu tinha,

Como sou filho da Dona Dazinha,

Gosto de exaltar todo meu povo,

Lembrando de outro personagem novo,

Vou glorificar sempre a terrinha.

Um comentário:

  1. Olá amigo João,

    parabéns eplo blog e por nos brindar com,fatos do nosso nordeste querido,adorei a poesia sobre a bodega de seu Mané,pois sou muito ligado as coisas do interior...

    Abraço.
    Paulo Romero.
    Meliponário Braz.
    João Pessoa,PB.

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