terça-feira, 5 de abril de 2011

INSPEÇÃO TÉCNICA


João Dehon


Outro dia fui, designado a participar de uma Equipe de fiscalização ambientalista e partimos para fiscalizar o Litoral, quando de repente, ao passarmos pela Br 230 nos deparamos com um dos maiores crimes de agressão à natureza que já assisti e todo este absurdo, bem ali na Praia de Intermares, bem ali na cara da APAN, bem ali na cara da Promotoria de Justiça de Cabedelo, bem ali na cara do IBAMA e porque não dizer na cara de todo mundo, inclusive da nossa da SUDEMA. Quando entramos no loteamento Boa Vista, tive vontade de chorar, me emocionei com um pássaro Anum Branco que voava em nossa direção como que pedindo socorro, pois seu ninho acabara de ser aterrado pelas máquinas que praticavam o crime. Como sabemos, os nossos manguezais que estão distribuídos ao longo de quase todo litoral brasileiro, são protegidos por Lei e a nossa constituição é bem clara quando diz que esses ecossistemas são intocáveis. O Artigo 63 da Lei Federal 9.605/98 é claro quando declara que alterar o valor paisagístico de qualquer área protegida por Lei é crime e merece multa. Vi o anum chorando a perda do seu ninho, mas também assisti jaçanãs em revoada fazendo giro sobre a máquina como que protestando, enquanto um sagüi aos pulos e assobios forte pedia aos homens que fossem menos cruéis com o seu habitat natural. Famílias inteiras eram arrancadas e misturadas ao aterro para depois serem sepultadas com movimentos bruscos daqueles gigantes de ferro chamados de tratores que frente àquelas minúsculas Rubiáceas e Solanáceas mostravam a incompetência dos homens diante da natureza. Vi com os olhos que a terra a de comer, um Cajueiro nativo, com mais de 80 anos de idade, cortado com serra elétrica para preservar a vida útil do trator, esquecendo-se da verdadeira utilidade daquele ser Vivo para aquele ecossistema, porque aquela árvore é suporte para a nidificação pelos menos quatro vezes por ano. Vi em pouquíssimas Sucupiras Pretas que restaram, sabiás, rouxinóis e bem-te-vis chorando em sinfonia a perda daquele cenário majestoso que Deus reservou para eles e agora o capitalismo selvagem degradava sem dó, desrespeitando o código florestal e o pior, desrespeitando a vida. Do Oiapoque ao Chuí, o Litoral Brasileiro tem aproximadamente 7.408 Km e nessa faixa uma variação considerável de ecossistemas variando entre os campos de dunas, ilhas, recifes costões rochosos, baías, estuários, brejos, falésias e baixios. Muitos deles, como praias, restingas, lagunas, maceiós e manguezais, embora tenham ocorrência constante, apresentam tal variedade biótica que a aparente homogeneidade em suas fáceis ecológicas apenas oculta especificidades florísticas e faunísticas vinculadas às gêneses diferenciadas dos ambientes em tão longo trecho litorânea. A riqueza biológica dessa faixa é algo impressionante e não pode e nem deve ser confundido com a riqueza material que o capitalismo cruel insiste em implantar no meio da humanidade, construindo uma outra natureza de cal e pedra. Assisti um caranguejo “chié” entrelaçado com um “siri” até parecia que estavam dando um abraço de despedida, enquanto um besouro mangangá fazia vôos rasantes clamando para que aquela maquina parasse com aquela violência e ele pudesse continuar fazendo a polinização pela qual a mãe natureza lhe encarregou. Vi nativos inocentes, com suas caiçaras derrubadas depois de passarem uma vida inteira usufruindo da pesca que o mar lhes oferece. No lugar das caiçaras, com certeza serão construídas suntuosas mansões que abrigarão pessoas outras que nem se quer conhecem aquele ambiente e nunca derramaram seu suor pela terra. A Constituição Brasileira, permite que nativos construam caiçaras para servirem de apoio as suas atividades e são esses nativos que procuram preservar os manguezais porque dali eles tiram o sustento de suas vidas. A Constituição Brasileira diz que os mangues são intocáveis para que as futuras gerações possam saber que é um dos ecossistemas mais ricos do mundo e grande responsável em matar a fome de grande parte da humanidade. O trator não queria saber qual o artigo da Constituição estava ferindo e continuava seu terror e a garça com suas pernas meio longas corria com medo de ser esmagada, enquanto a cobrinha de cipó corria em direção ao resto de vegetação, querendo se misturar a ela como se aquilo lhe fosse uma defesa. Autoridades dos dias meus, gente do nosso tempo, será que a máquina vai continuar destruindo tudo, simplesmente para levar dinheiro para a conta de mais um rico? Será que essa gente não tem filho e não reserva para eles dias melhores? Ou será que a interpretação de dias melhores é apenas o vil metal. A questão Ambiental na Paraíba passa pela conscientização de cada um paraibano, assim como a coisa é feita no resto do mundo. Porém, não é isto que estamos vendo, o que se vê realmente é que nos últimos vinte anos os principais ecossistemas naturais da Paraíba têm enfrentado a guerra da devastação, porque as autoridades preferem proteger os seus apaniguados, a conversar a mãe natureza. Recursos naturais como manguezais, flora e fauna tem sido o principal alvo do capitalismo e dos afilhados dos políticos que teimam aqui no Nordeste em serem chefes do povo, quando na realidade o povo é quem é o seu chefe. Esses impactos que acontecem todos os dias, todas as horas, todos os minutos, todos os segundos e a todos os momentos, comprometem a sustentabilidade das atividades sócio-econômicas do Estado. As Leis, os Decretos, as Resoluções e as Normas Ambientais estão aí, mas ELES não estão nem aí para tudo isto, pois têm costas quentes e a natureza que se dane. E a máquina barulhenta e rude rodava levando a flor. Adeus lindo manguezal, adeus refluxo do mar, adeus passarinhada gritava a flor a chorar. Adeus lindo por do sol, adeus maré e quebra mar, adeus cajueiro velho, adeus caranguejo Uçá e a máquina barulhenta e rude, faz ouvido de mercador e o seu material rodante, rolava levando flor e ela tonta, tonta com o terror, misturava-se com a terra envolvida só em dor. E agora!.... João Pessoa, 16 de Dezembro de 2003.

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